segunda-feira, 29 de maio de 2017

Democracia Endireita


Caderno de Política
Por Cícero Esdras Neemias

Hoje o chefe invadiu a nossa seção editorial do Caderno de Política com a Bíblia embaixo do braço e se aventurou a redigir uma matéria de apoio a candidatura do veteraníssimo Mestre Carvalhosa.

Foi-se e deixou a Bíblia e em enquanto eu traçava as primeiras linhas deste artigo, resolvi seguir o chefe e abri-la, usando na parte que caísse. Pois bem, caiu ali, em Mateus 7:5, em que teria dito o Cristo na pregação (diga-se de passagem, esse foi um homem que não foi do pó ou ao pó, mas da pregação à pregação): Hipócrita, tira primeiro a trave do teu olho, e então cuidarás em tirar o argueiro do olho do teu irmão.

Esse é o trecho da Bíblia que amontoa a maior quantidade de máximas de táxi e fraseados de salão de beleza de todas as classes, pois tem as passagens clássicas das “pérolas aos porcos”, “não julgueis para não ser julgado”, “você será medido com a mesma medida que mede os outros” (que é mais velho que Cristo e remonta as primeiras aulas de grego quando aprendemos o protagórico panton métron anthropos), “acautelai-vos dos falsos profetas”, “lobos em peles de ovelhas”, “ninguém colhe uvas de espinheiros”, “árvore boa produz bons frutos”, “pelos frutos se conhece a árvore” e outras platitudes que foram incorporadas ao folclore dos ditos populares que animam uma corrida de táxi ou uma sessão de luzes nos cabelos. Mas de forma geral, o cisco no olho alheio que é retirado por homem vendado é imagem que o populacho não gosta, pois revela muito das nossas práticas tropicais - o cisco no olho alheio sempre cega mais que o meu tapa-olho, nestas terras de piratas e gentios.

Fato é que a nossa ideia de democracia direta (ou o cisco no nosso olho, se assim preferir o leitor) não é sentida por todos na perspectiva horizontal que gostaríamos (horizonte temporal, diga-se de fato). Ecoa nas redes a ideia de que quem defende voto direto o quer fazê-lo apenas e tão somente para dar asilo a um bandido contumaz.

E isso não é verdade.

Não defendemos Democracia Direta “ad hoc” – nossa ideia de democracia direta é plena e não faria o menor sentido abrir mão dela agora.

Não por outra razão (e desculpem por começar uma frase com “não” mais uma vez), a nossa leitura  intraconstitucional não identifica transferência do direito de voto (que por regra geral se exerce via soberania popular) para o Congresso. Transferir a organização do evento do Judiciário (TSE) para o Congresso nos parece a melhor interpretação da constituição e sob o ponto de vista ideal, ainda que não fosse isso, um plebiscito (qual seja, a palavra final da plebe) sempre será soberano e terá validade maior do que as letras, pois essa soberania é a fonte de todas essas vontades e mi-mi-mi’s atuais. Jamais uma decisão soberana será inconstitucional, assim como uma assembleia nunca será ilegal ou antiestatutária. A assembleia é a fonte derradeira de tudo. E nada de PEC ou reforma constitucional, por favor. Chega.

Vale lembrar, por outro lado, que não é o voto a garantia de que há em um sistema a democracia plena: nos EUA a eleição é indireta e mesmo com a prática do gerrymandering, ninguém ousa dizer que lá não há democracia, assim como no caso da Coreia do Norte e do Irã, cujas eleições são diretas e nem por isso alguém ousa dizer que por esse fato, tais recônditos são dotados de um regime democrático. Os exemplos podem sobejar, de um lado ou de outro; mas não é propriamente esse detalhe que nos importa, vis-à-vis o problema que estamos vivendo sobre a falta de um Cristo Salvador e Pregador.

Aqui defendemos que o conceito de democracia está diretamente ligado ao menor grau possível de intermediação nas decisões da fonte e respectivo resultado final.

Idealmente, nenhum Estado será sempre melhor que algum.

Mais do que Diretas Já, defendemos um Endireitas Já, nem que pra isso, já nos alertou Carvalhosa, tenhamos que nos reunir novamente para concluir que com essa (des)ordem constitucional, vamos reproduzir sempre mais do mesmo e em qualidades cada vez mais decadentes.

Por favor, vamos desintermediar.