por Cícero Esdras Neemias
Um político é alguém que cuida, em primeiro lugar, da polis.
Trata, na sua função, de gerir algo que não lhe pertence, a chamada res publicae (coisa pública).
Como gestor fiduciário da coisa pública, ao cuidar da polis, um político nada mais faz do que dialogar com os vários possíveis beneficiários qual o melhor jeito de gerir essa coisa, que se constitui de vários bens públicos.
Ele prioriza, portanto, o emprego desse patrimônio em favor do número máximo de beneficiários.
Se ele conseguir empregar esse patrimônio em favor de TODOS os beneficiários, ele será um gestor espetacular, um ótimo gestor, portanto, um político brilhante.
Se o fizer em favor da maioria absoluta, será um gestor muito bom, mas não assim, digamos, espetacular.
Se o faz em favor de uma maioria simples, será regular, pois não fez mais do que a sua obrigação.
Daí para baixo ele passa de medíocre (se emprega no benefício de uma ou várias minorias), mas pode muita vez passar por "bom no que faz" se a minoria beneficiada for uma minoria qualificada: idosos, crianças, miseráveis. Impõe sacrifícios à maioria em busca de uma "causa maior". Sacrifícios verdadeiros, sobretudo no campo dos impostos e dos privilégios.
Não será assim se essa minoria for de empresários ou empreiteiros ou ainda se o benefício franqueado à maioria for proporcionalmente menor do que o benefício franqueado a uma certa minoria de empresários - isso é o pior dos mundos e esse político está, talvez, no nível daquele que gere a coisa pública no próprio interesse. Tanto em um caso como no outro esse político é chamado de populista.
O populista é aquele que, com pequenos benefícios para muitos e muitos benefícios para poucos, dá a impressão de que atende equitativamente a maioria ou a totalidade, mas na verdade ele beneficia poucos com a compra do silêncio de muitos.
Em priscas eras essa forma de fazer política foi conhecida como pão e circo. Em Roma, onde o populismo se tornou forma de gestão da coisa pública a partir daquela era Flaviana, o resultado não acabou sendo bom para Roma. Teve que se tornar por algum tempo uma República Imperial Evangélica a partir de Constantino até ser invadida por hordas de godos que meteram fogo em tudo e enclausuraram os sobreviventes em feudos.
O Brasil está muito próximo de se tornar uma República Evangélica antes de, logo logo, arder em chamas.
A origem disso é a mesma que espalhou o fogo em Roma - populismo.
Lula é tido por muitos como um "bom político", por outros, "o melhor deles". Tanto é que o próprio Lula aprisionou o seu partido a ponto da instituição partidária trata-lo como única opção viável de poder. Ele, Lula, no fundo, deseja implementar uma Monarquia Maoista com ele, Lula, na cadeira de Monarca local. Já declarou isso nas linhas, nas entrelinhas e na folha em branco várias vezes.
No evento de hoje, em que se sentará no banco esquentado pelo fiofó de inúmeros traficantes e corruptos, há na imprensa de baixa substrato intelectual a tese voando de que ele tentará politizar o evento diante do magistrado. Errado. Nada mais equivocado. Lula há tempos já partidarizou a discussão - e partidarizar nada tem a ver com politizar.
Outros ainda piores dizem que (e, aqui, assumindo ad argumentandum tantum que ele estaria, ok, politizando o discurso), o vitorioso óbvio seria ele, Lula. Isso porque no entender de muitos, Lula seria "muito bom no que faz" (coincidindo aqui "fazer" com "política"). Tratam-no como um expert na arte política, "um dos melhores", senão "o melhor" no campo da política.
Há ainda quem o considere o derradeiro conciliador do conflito capital X trabalho.
Nada mais falso, nada mais temerário, nada mais fantasioso e nada mais errado do que achar que Lula é, foi ou poderá um dia chegar a ser um bom político ou um conciliador histórico.
A começar pelo fim, Lula foi incapaz de conciliar o conflito capital e trabalho, primeiro porque o conflito em si, não existe, segundo porque para entende-lo (inclusive em sua inexistência) é essencial que o estudioso conciliador domine um conceito que Lula ignora completamente - o conceito de trabalho. Embora Lula domine com certa desenvoltura o conceito de capital (sobretudo da forma imaginada por Marx, como mecanismo de exploração e opressão), a falta de compreensão do que é trabalho tornou Lula absolutamente tendencioso em favor do capital (que hoje lhe dá retornos invejáveis).
Ademais, Lula nunca governou sequer para uma minoria qualificada, exceto se a qualificação couber para empreiteiros. Lula distribui 10 para 30 milhões e, ao mesmo tempo, distribuiu os mesmos 10 para outros 10.
Tecnicamente foi um péssimo político, pois o que ele conseguiu para os tais 30 milhões foi a um custo insuportável para esses mesmos 30 milhões. Custou caríssimo, a ponto do prejuízo posterior ter coberto integralmente o benefício inicial.
Lula herdou tempos de bonança montados pelos governos que o precederam e deixou de herança para a sua sucessora um prejuízo que a inabilidade dela só fez agravar a conta do prejuízo.
Ao lidar com a res publicae, ao ter que gerir os recursos públicos para aplica-los para o bem de uma parcela de beneficiários, nunca houve na história do Brasil alguém que tenham aplicado a maioria dos recursos de forma tão restritiva e pessoal quanto Lula.
Lula foi sem dúvida o pior político que já passou pelo Brasil.
Ele foi o arquiteto da destruição da esquerda nacional ao associá-la a sua pessoa, razão pela qual a esquerda brasileira hoje é cheia de gente de opinião sem contar com uma única pessoa de ação.
Lula destruiu o país e isso está absolutamente descortinado hoje.
Nunca, jamais, em momento algum, Lula foi um político de esquerda (algo que designa aquele tipo de político que usa o Estado e a res publicae para beneficiar uma minoria qualificada). Lula também nunca foi o pai de uma conciliação entre o capital e o trabalho, pois falta a Lula o conhecimento mínimo do conceito de trabalho (embora tenha demonstrado profundo conhecimento sobre o funcionamento do capital).
Mas o mais grave foi que essa aura de "bom no que faz" foi obtida as custas de um recurso que se tornou bem abundante para ele - dinheiro.
Lula não se tornou "bom político", ele literalmente comprou esse status. Comprou gastando dinheiro no Congresso, no partido, no empresariado que lhe dá de comer, nas nações amigas e, em alguns casos, no eleitor que ganhou 100 contos em 2004 e hoje tem que pagar uma conta de 100 mil contos para pagar aqueles 100 que pegou 10 ou 15 anos atrás.
O discurso de convencimento de seus interlocutores era, sempre foi, é e sempre será comprado.
Comprando o seu interlocutor, pagando para que ele concorde com você, qualquer um se torna bom político.
Se há uma virtude em Lula que nem Maluf conseguiu foi seu poder de compra (e não de convencimento) - nunca antes na história deste país alguém conseguiu comprar tanta gente por tanto tempo. Se isso for sinônimo de "bom político", hei de concordar.
Do contrário, se "bom político" é só aquele que gere fiduciariamente a coisa pública em favor do número máximo de beneficiários que há de receber os benefícios de forma equânime e na medida de suas necessidades, então, você precisa concordar comigo leitor, distinta leitora, que Lula é, em si, uma escola ambulante de péssimo político.