segunda-feira, 26 de junho de 2017

2018: uma ano "bola preta"

Caderno de Política
por Cícero Esdras Neemias

As eliminatórias para 2018 já passaram de sua metade. Mas há outra metade ainda para ser jogada a partir de outubro.

Não leitor, leitora: não me refiro ao ludopédio, mas sim ao ludo-eleitoral. Em outubro termina o prazo para mudar de domicílio eleitoral e o calendário para as eleições 2018 abre-se oficialmente. Coincidentemente quando terminam as eliminatórias do ludopédio (estas, que se lasquem).

De outubro de 2017 a outubro de 2018 teremos o jogo jogado das eleições: em abril a janela partidária se fecha, em julho os candidatos são definidos, em agosto registrados e, ato contínuo, começa o show na TV.

Mas é importante notar que as eliminatórias já começaram.

Aécio Neves já ficou pelo caminho.

Outros tendem a seguir Neves.

Mas o assunto do momento, a saber, o resultado de um Datafolha (órgão de pesquisa tão sério quanto um Santa Klaus chinês), mostra Lula, Bolsonaro, Marina e Dória entre os presidenciáveis. Apesar da não seriedade do instituto, há detalhes que precisam ser melhor entendidos.

Lula há de ser pego no antidoping antes e será tirado da disputa - isso é mais cristalino que Versalhes inteira.

Alckmin item - não resistirá ao primeiro antidoping da Lavajato e sobrará apenas os não citados ou não envolvidos: Marina (até onde se sabe), Ciro, JB, Dória, Bolsonaro (Caiado é apenas uma homeopatia da pesquisa para diluir o efeito Bolsonaro em mais nomes, assim como Luciana Genro e Eduardo Jorge à esquerda). Até aqui, nada diferente do que já afirmou R. Constantino em outro foro, no que assentimos.

A esquerda, portanto, precisará de Ciro, a quem Lula há de transferir os seus 30% de neomalufismo. Os demais não tem estômago nem boca para engolir esse "Petecontalismo" (para quem não entendeu, é um trocadilho sem-gracinha de PT com "pentecostal").

Tudo indica que podemos ter uma polarização Bolsonaro-Ciro, com direito a rounds de dar inveja a qualquer atleta do UFC durante os debates no horário nobre. As chances de termos esses dois candidatos literalmente "saindo na mão" são de elevada consideração.

Voltemos à análise dos números, portanto. Notem que todos os "analistas" estão centrados na "intenção de votos". Deixam de lado um dado notável: Lula tem grau de rejeição de 45% (mais do que Aécio, um eliminado com 44%; o que apenas reforça a tese de que Lula não deverá estar nessa disputa em 2018), enquanto que os demais têm algo entre 20%-25%.

Há uma sobreposição das rejeições na casa aproximadamente de uns 15%, observando os nulos e brancos em alguns cenários: qual seja, há uma grande massa que não vota em Lula de jeito nenhum, há também uma grande massa que não volta em Bolsonaro de jeito nenhum. Dessa massa lulista há quem faça voto útil para impedir Bolsonaro (apesar do número de rejeição ao seu nome e o número de nulos num cenário com Bolsonaro e sem Lula ser o mesmo) assim como há quem, sem Bolsonaro, migra para os nulos.

Contudo há uma massa persistente de nulos na casa dos 10%-15%: qual seja, um número elevadíssimo de gente decidida a não votar em ninguém, simplesmente porque representam um "establishment". Estar em Brasília hoje é uma desvantagem. Por isso, essa rejeição tende a crescer com o avanço das discussões. Por que? Simples - porque nunca tivemos um grau tão baixo de indecisos (em torno de 5%) em momento tão antecipado das eleições e o "Partido NULO" tende a ganhar "eleitores" com o avanço das discussões se as posturas de Bolsonaro oscilarem, como tem ocorrido em seus votos dúbios nas reformas trabalhista e previdenciária, bem como no baixo empenho quando da PEC do Teto.

É fato que as "economicagens" não falam sozinha, mas são sim elemento importante e não apenas a ética, mas também como o candidato vai conduzir a máquina para gerar riquezas será tema fundamental. Aqui há uma soma em que o interesse pela política não anula o outro, pela economia e vice-versa.

E nesse sentido, na intersecção desses dois temas é que vemos pela primeira vez na nossa história um fenômeno típico de democracias modernas (tem ocorrido com cada vez mais frequência nos EUA e chegou a decidir a última eleição levando Trump para Casa Branca): não haverá briga por indecisos e sim briga por rejeições.

Isso é efeito direto do modelo de campanha bolado pelo genial João "Feira" Santana e sua sócia, Moniquinha "Dona Xepa" Moura. Criaram uma campanha de divisão, enterraram o "Lulinha Paz & Amor" do verdadeiro "Galo de Briga" e ex-marqueteiro de Lula e Maluf (Duda Mendonça) e jogaram na arena eleitoral a "Anta de Briga" Dilma, reforçada pelos notáveis conselhos de Marilena Chauí e pronto: a campanha do nós contra eles, a campanha do ódio, gerou no país o quase desparecimento dos famosos indecisos.

Hoje todos estão decididos e escolhem com base na rejeição (alguns até com base no ódio puro e rústico).

Mas esta rejeição se sofisticou e ficou smart; sem que parte dos analistas, ao que parece, ter ainda completamente entendido.

Explico: apesar da esquerda e seu público fiel ter seus "corruptozinhos de estimação" (desde Vargas e Adhemar é assim) e a direita, sem os seus (como Neves e o velho Malufão) passa a depender cada vez mais de Bolsonaro (este, dentre todos, o único que consegue se afastar do rótulo de corrupto mas ainda gera dúvidas na parte verdadeiramente política, ante os dúbios votos em reformas), nem um lado nem outro conseguem capturar completamente as rejeições que em tese os beneficiariam (qual seja, as rejeições aos adversários nem sempre viram votos para si e têm se tornado parcela significativa e crescente de nulos).

Em outras palavras (ou em números), os 45% de "Lula nem a pau" não são automaticamente absorvidos por Bolsonaro e os 25% de "Bolsonaro jamais" não são absorvidos ou aproveitados por Lula (e muito menos pelos seus genéricos: Ciro, Marina, JB e etc).

À esquerda restará o discurso balofo da homofobia, xenofobia, islamofobia e outras invencionices que não capturam o novo padrão de exigência do eleitor: ficha limpa. Bolsonaro vem crescendo mas talvez encontre um teto à direta quando surgirem claramente quais são as suas opiniões sobre reforma da previdência, papel do Estado na economia, privatizações, fim de inúmeras estatais e agências, federalismo, partidarismo, estado laico e etc.

Em primeiro lugar é preciso que se conscientizem que há de ser uma disputa entre fichas-limpas e, num segundo estágio, de plano de ação. No primeiro ponto os únicos que levam vantagem passam a ser Bolsonaro (o mais distante de todos do "establishment") e Dória (este mais próximo por conta da placa que escolheu concorrer). Os demais já foram Ministros de Lula ou Dilma ou já foram citados, filmados ou flagrados em situações que se não sujam a ficha, ao menos uma borra de café deixam.

Quanto ao plano de ação, é ai que entrará a absorção ou não dessa rejeição. Essa rejeição fixa tende a superar a das últimas eleições: em 2014, se contados os que "justificaram o voto", tivemos algo em torno de 25%, pouco mais de 37,2 milhões de eleitores que não compareceram ou votaram nulo ou em branco; a diferença entre Dilma e Aécio foi de pouco mais de 2%, algo em torno de pouco menos do que 3,5 milhões a favor de Dilma, portanto, de menos de 10% do universo de eleitores que literalmente rejeitaram a disputa.

Já falamos aqui que essa história de voto obrigatório no Brasil é uma tolice. Há anos que ele já é facultativo. Mas essa facultatividade, antes uma mera preguiça, hoje vai expressa em frontal rejeição e tem crescido ano a ano. Ganha, nestas eleições de 2018 que começaram hoje, uma característica qualitativa: passa a ser uma rejeição sistêmica e cada vez menos pessoal.

O eleitor sem partido, o eleitor livre, o eleitor que participa e escolhe, que se manifesta nas redes sociais livremente, está sem opções, sem candidatos independentes e isso está criando uma rejeição sistêmica que ano a ano não é capturada em votos a favor do sistema.

Comentários inteligentes como o de R. Constantino, que pede para se levar em conta outros elementos no futuro desse jogo, como o Partido NOVO, além de outros partícipes que possam compor com discursos fortes como o de J. Dória, são dados que podem reverter essa rejeição sistêmica.

O que o político lá de Brasília ou da carceragem de Curitiba (que são fungíveis entre si, diga-se de passagem) estão custando a aprender é que o sistema que operavam acabou e essa rejeição sistêmica (que se reverte em pessoal em segundo estágio ou começa pessoal em estágio anterior, mas não vira efetivamente "voto" sendo deliberada estratégia eleitoral) irá ser o fiel da balança daqui pra frente.

Aos políticos faria um enorme bem se as redes sociais criassem um "thumbs down" no lugar do "like": essa sim será a verdadeira ferramenta com que terão que lidar em 2018, quando um novo sistema entrará - pelo voto, ou pelo veto. Notarão que os "thumbs down" têm características intersectivas tornando a rejeição de pessoal para sistêmica, qualificada.

Se assim continuar, fico feliz - a democracia só não vai funcionar para quem não a entende (e neste caso, dá pra dizer que há muitos com mandato popular nessa situação).