domingo, 5 de fevereiro de 2017

Idiotistão

Vera Cruz Times
por José da Silva

Dizem que os primeiros cem dias de um governo resumem de antemão os quatro anos vindouros.

Se isso fosse verdade bastariam cem dias.

Mas no caso de Donaldo Trombeta, seus cem dias da marmota são o resumo do que os próximos quatro anos não serão.

Dá-se início a Era do Idiotistão: administração por twitter cercada de telefonemas que se encerram com o novelesco "bater o telefone na cara", insultos e molecagem em redes sociais (tanto dele contra outros, quanto de outros contra ele) e medidas curiosas por decretos.

As mais famosas são as medidas contra estrangeiros, especialmente países de maioria muçulmana.

Aqui já se disse que quando precisamos diferenciar jihadismo de islamismo, temos que entender islamismo primeiro e ver como os jihadistas associam "morte" a "bem" e "ocidente" e "capitalismo" ao "mal", para que a Jihad Menor prevaleça como forma catequizante. Isso não é e nunca foi uma "questão de Estado" e não é na relação estatal bilateral que isso se resolve (seja no combate ao jihadismo que a parceria Putin/Al Assad fazem; seja no isolacionismo que promove Trump de forma marota). Esse buraco é muito, muito, muito mais embaixo...

E esse detalhe se tornou "a" desculpa: assim como o Muro do México, a batida de telefone na cara do Primeiro Ministro Australiano em uma conversa sobre a divisão da conta de refugiados, os desencontros em relação ao Pacto do Pacífico, as birrinhas com a China, a revisão da aproximação com Cuba, o apoio ao Brexit.

Em menos de um mês, todas as atenções foram voltadas para questões de política internacional e esses que hão de ser uns cem dias da marmota, transparecem uma estratégia: atacar a globalização; tornar novamente o país refém de meia dúzia de investment bankers gordos de Wall St.; inscrever alguns amigos na revolving door que existe entre a K Street e Wall St. E tudo isso de forma simples: começa-se fazendo o povo a perder o hábito de ler jornais.

Como fica agora aquele argumento da esquerdinha brasileira, que ficou anos e anos dizendo que a globalização era obra a direita estado-unidense? aquele papinho de que a globalização atende ao interesse e ao enriquecimento dos grandes grupos americanos? aquele papo insano de que a imprensa (sim, sempre ela) é a grande culpada por esse status de proteção dos interesses da direita contra o povo (que supõe-se ser naturalmente de esquerda, pois pobre tem que ser de esquerda)?

Pois bem - esses ataques estão na base dos sonhos antiglobalizantes latino-americanos populistas.

Aqui culpa-se a Globo e o Roberto Marinho, a Veja e o Estadão e usa-se o twitter para falar a verdade ao povo; lá, culpa-se a CNN e o NY Times, a Times e o Michael Bloomberg e usa-se, para falar a verdade ao povo o.... twitter!!!!

O populismo, como se disse aqui, não respeita lados, pois ele é essencialmente antiliberal e, paradoxalmente, antiprogressista.

The enemy of enemy is my friend - e nessa toada que já levou a colocar FDR, De Gaulle, Churchill e Stálin para um mesmo lado, ou pior, Stálin, FDR e Mao de um mesmo lado contra Chiang e todos contra o Japão, incrivelmente alinha Trump e... Putin!, ou Trump e Le Pen ou.... Trump e Duterte!!!

O bate-boca (sempre por Twitter - aliás, investigue-se se há investimentos pessoais de Trump ou relacionados em TWTR na Bolsa de NY...) com o representante do Irã, que daqui a algum tempo vai ser considerado o início da declaração de uma Guerra, marca também as inconsistências do Idiotistão inaugurado por Trump em relação ao jihadismo: está fora de sua lista uma das maiores ditaduras do planeta, baseada nas formas mais radicais de repressão a minorias e nas interpretações mais obtusas do islamismo e que abriga de forma livre membros de grupos no mínimo duvidosos, sem contar ser essa nação a terra Natal de gente como Osaba bin Laden - a monarquia absolutista e fundamentalista da Arábia Saudita (talvez a última monarquia absolutista ainda viva no mundo ao lado da Coréia do Norte, que finge ser uma república).

Ao manter-se em silêncio diante de Nigéria, Arábia Saudita, Egito, Omã e outras pérolas do jihadismo que ficaram de fora, o aspecto populista da decisão ficou óbvio. Trump protege o jihadismo que o beneficia e ataca o islamismo que não lhe fede nem cheira. E esse islamismo que não lhe faz cócegas traz algumas cerejas de jihadismo que de fato incomodam, mas não a ele e nem aos americanos: falamos da Síria, que tem no poder um grande amigão de Putin, o novo chapa de Trump, que é adversário de Erdogan, um enigma que foi poupado por Trump como se fosse um mar de democracia, que sofreu um golpe que alinhou Erdogan a Dilma (por iniciativa exclusiva dela...); ou o Sudão, que tem no poder um sem fim de sauditas ligados ao time das Arábias, protegés de Trump nesse caldo de sururu com Maomé e que geram infinitas dores de cabeça a Israel, um país que Trump detesta depender e adora falar mal privadamente.

Trump ainda comete a proeza de colocar dentre suas vítimas o México e o Iêmem, ajudando energúmenos de plantão a aproximá-los pela vitimização.

Seu discurso antiglobalização seguido de um ataque à Lei Dodd-Frank, permeados por falas improvisadas em uma língua que usa a sintaxe do dilmês e a morfologia do "ingrêis" mostra que o maior produto exportação brasileiro, a ignorância, obtém seu auge agora, nos trinados de Trombeta.